Qual a diferença entre ativo de contrato e contas a receber?

Reconhecimento

Embora não seja um termo completamente novo, o conceito de Ativo de Contrato, introduzido pelo CPC 47 (IFRS 15) – Receita de contrato com cliente, causou um pouco de confusão entre os contadores. Os principais questionamentos estão relacionados à quando contabilizar um Ativo de Contrato e quando contabilizar um Contas a Receber.

É importante destacar que Ativo de Contrato não é a mesma coisa que Contas a Receber. A diferença entre ambos é observada pela definição que a norma contábil apresenta:

Ativo de contrato: O ativo de contrato é o direito da entidade à contraprestação em troca de bens ou serviços que a entidade transferiu ao cliente quando esse direito está condicionado a algo além da passagem do tempo (ver apêndice A do CPC 47).

Contas a receber: O Contas a Receber é um instrumento financeiro definido pelo CPC 39 (IAS 32) – Instrumentos Financeiros, como um direito contratual de receber caixa no futuro ou outro ativo financeiro de outra entidade (ver itens 11 e AG4 do CPC 39).

Ou seja, a principal diferença é a condicionalidade.

O ativo de contrato é um direito condicional, enquanto o contas a receber é um direito incondicional.



O reconhecimento contábil de um Ativo de Contrato surge quando a empresa, como fornecedor, já executa algo, entrega parte dos serviços ou bens conforme acordados, mas, de acordo com o contrato, ainda tem algo a fazer antes de faturar para o cliente.

O Basis for Conclusions, no item BC323, resume as considerações do International Accounting Standards Board (IASB), sobre esse tema, conforme abaixo.

Em muitos casos, esse Ativo de Contrato é um direito incondicional à contraprestação – um recebível – porque apenas a passagem do tempo é necessária antes que o pagamento dessa contraprestação seja devido. No entanto, em outros casos, uma entidade satisfaz uma obrigação de desempenho, mas não tem um direito incondicional à contraprestação, por exemplo, porque primeiro precisa satisfazer outra obrigação de desempenho no contrato. O IASB, de acordo com o exposto na IFRS15, decidiu que quando uma entidade satisfaz uma obrigação de desempenho, mas não tem um direito incondicional à contraprestação, uma entidade deve reconhecer um ativo de contrato. Os conselhos observaram que é importante fazer a distinção entre um ativo de contrato e um recebível, porque isso fornece aos usuários das demonstrações financeiras informações relevantes sobre os riscos associados aos direitos da entidade em um contrato. Isso porque, embora ambos estivessem sujeitos ao risco de crédito, um ativo de contrato também está sujeito a outros riscos, por exemplo, risco de desempenho (item BC323, Basis for Conclusions – IFRS 15).

Para exemplificar, imagine a operação de uma empresa de serviços de tecnologia da informação.

Essa empresa foi contratada para desenvolver uma customização específica no software do seu cliente. Essa customização demanda 9 meses e terá início em 1º de julho de X1, a obrigação de desempenho é satisfeita a medida em que o trabalho vai sendo desenvolvido, ou seja, o reconhecimento da receita é ao longo do tempo. Porém, na assinatura do contrato, a empresa concordou que o cliente precisaria dar o “aceite” no projeto e pagaria o montante de R$ 100.000 por todo o projeto apenas na conclusão.

Ainda, vamos considerar que a empresa consegue determinar objetivamente que o controle do serviço é transferido para o cliente, seguindo as especificações pactuadas no contrato, e que o aceite do cliente é uma formalidade que não afeta o reconhecimento da receita e sim a validação do direito a receber. Esse cenário é previsto no item B84 do CPC 47.

No final do ano, o projeto já possui 6 meses de evolução e, como mencionamos anteriormente, é necessário reconhecer a receita com base no progresso até a conclusão.

A empresa avalia que o projeto está 70% concluído, então é separado 70% do preço total, ou seja, R$ 70.000.

Os lançamentos contábeis são:

O crédito é feito na receita e o débito, referente ao direito de recebimento pelo serviço prestado, é feito no Ativo de Contrato e não em Contas a Receber.

Observe que, após apenas 6 meses de trabalho, a empresa NÃO tem o direito incondicional a um recebimento. A condição que a empresa deve cumprir antes de possuir o direito incondicional de receber o valor é concluir o projeto.

No final do ano, essa condição ainda não foi atendida, então a empresa NÃO PODE reconhecer um contas a receber.

Em seguida, a empresa trabalha por mais 3 meses, conclui o projeto e entrega para o cliente. Nesse momento, a empresa tem um direito incondicional a um recebimento e não a um ativo contratual de qualquer tipo, pois o projeto foi finalizado e entregue.

Além disso, a empresa precisa reconhecer a receita ao longo do tempo para esses 3 meses restantes.

Os lançamentos contábeis ao longo dos 3 meses restantes são:

Ao final do projeto, após a conclusão, a empresa deve fazer a constituição do contas a receber e os lançamentos contábeis devem ser:

No item BC325 do Basis for Conclusions, o IASB ratifica que, em muitos casos, surge um direito incondicional à contraprestação quando a entidade satisfaz a obrigação de desempenho e fatura o cliente. Por exemplo, um pagamento por bens ou serviços é normalmente devido e uma fatura é emitida quando a entidade transferiu os bens ou serviços para o cliente. No entanto, o ato de faturar o cliente para pagamento não indica se a entidade tem um direito incondicional à contraprestação. Por exemplo, a entidade pode ter um direito incondicional à contraprestação antes de faturar (recebíveis não faturados) se apenas a passagem do tempo for necessária antes que o pagamento dessa contraprestação seja devido.

Em outros casos, uma entidade pode ter um direito incondicional à contraprestação antes de ter satisfeito uma obrigação de desempenho. Por exemplo, uma entidade pode celebrar um contrato não cancelável que exige que o cliente pague a contraprestação um mês antes de a entidade fornecer bens ou serviços. Nesses casos, na data em que o pagamento é devido, a entidade tem um direito incondicional à contraprestação. No entanto, nesses casos, a entidade deve reconhecer a receita somente após transferir os bens ou serviços.

Na apresentação do Balanço Patrimonial, Ativo de Contrato e Contas a Receber NÃO PODEM ser somados, e, portanto, devem ser apresentados separadamente, de acordo com o item 105 do CPC 47 (IFRS 15) e reforçado no item BC325 do Basis for Conclusions.

Quando qualquer das partes do contrato tiver concluído o desempenho, a entidade deve apresentar o contrato no balanço patrimonial como ativo de contrato ou passivo de contrato, dependendo da relação entre o desempenho pela entidade e o pagamento pelo cliente. A entidade deve apresentar separadamente como recebíveis quaisquer direitos incondicionais à contraprestação (item 105 do CPC 47 (IFRS 15) – Receita de Contrato com Cliente).

Uma vez que uma entidade tenha um direito incondicional à contraprestação, ela deve apresentar esse direito como um recebível separadamente do ativo do contrato e contabiliza-lo de acordo com outros requisitos (por exemplo, IFRS 9 ou Tópico 310). O IASB decidiu que o IFRS 15 não precisa tratar da contabilização de recebíveis além do reconhecimento de receita (item BC324, Basis for Conclusions – IFRS 15).

 A estrutura abaixo evidencia a forma de apresentação no balanço patrimonial.

O ativo de contrato NÃO é um instrumento financeiro, portanto o IFRS 9 (Instrumentos Financeiros) não se aplica aqui, com uma exceção: impairment (PECLD). Dessa forma, deve-se avaliar o ativo do contrato quanto a qualquer redução no valor recuperável, e determinar a perda de crédito esperada (PECLD) e reconhecer uma provisão para perdas, exatamente da mesma forma como é reconhecido para o Contas a receber. 

Divulgação

O CPC 47 (IFRS 15) – Receita de contrato com cliente, determina que a empresa precisa divulgar, em notas explicativas, informações relevantes a respeito dos ativos de contratos.

O item 116, determina que a entidade deve divulgar todos os itens seguintes:

(a) saldos inicial e final de recebíveis, ativos de contrato e passivos de contrato provenientes de contratos com clientes, se não forem de outro modo apresentados ou divulgados separadamente;

(b) receitas reconhecidas no período de relatório que foram incluídas no saldo de passivos de contrato no início do período; e

(c) receitas reconhecidas no período de relatório provenientes de obrigações de performance satisfeitas (ou parcialmente satisfeitas) em períodos anteriores (por exemplo, alterações no preço da transação).

Exemplos:

O item 118 do CPC 47 (IFRS 15), reforça que a entidade deve fornecer explicação sobre as alterações significativas nos saldos de ativos de contrato e de passivos de contrato durante o período de relatório. A explicação deve incluir informações qualitativas e quantitativas. Exemplos de alterações nos saldos de ativos de contrato e passivos de contrato da entidade incluem quaisquer dos itens seguintes:

(a) alterações devidas à combinação de negócios;

(b) ajustes cumulativos de receitas que afetam o ativo de contrato ou o passivo de contrato correspondente, incluindo ajustes decorrentes da alteração na medida do progresso, da alteração na estimativa do preço da transação (incluindo quaisquer alterações na avaliação de se a estimativa da contraprestação variável é restrita) ou da modificação de contrato;

(c) redução ao valor recuperável de ativo de contrato;

(d) alteração no prazo para que o direito à contraprestação se torne incondicional (ou seja, para que o ativo de contrato seja reclassificado como recebível); e

(e) alteração no prazo para que a obrigação de performance seja satisfeita (ou seja, para o reconhecimento de receitas provenientes de passivo de contrato).

Exemplos do item (c), (d), (e):


Os ativos de contratos diminuíram à medida que o Grupo passou a prestar menos serviços em antecipação aos cronogramas de pagamentos acordados para contratos a preço fixo. O Grupo também reconheceu uma provisão para perdas decorrentes de ativos de contratos após a adoção do CPC 48 (IFRS 9). Os passivos de contratos para descontos de volumes previstos e de contratos de consultoria de TI aumentaram em decorrência de negociação de pagamentos antecipados maiores e crescimento na atividade de contratos em geral.